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Dia Mundial do Rim: Especialista alerta para a importância do tratamento conservador e dos aprendizados com o COVID-19 na terapia de diálise no Brasil

Muitas vezes em segundo plano, as doenças renais acabam negligenciadas pela sociedade. Porém, o Covid-19 trouxe para a linha de frente a importância do manejo dos rins e dos procedimentos dialíticos em pacientes em terapia intensiva. Além do mais, a função renal é uma possível comorbidade consecutiva em pacientes diabéticos e hipertensos, o que a torna também relevante. De acordo com a nefrologista Lygia Vieira, Diretora Médica de Tratamento Intra-hospitalar da DaVita Tratamento Renal e professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), deveria de haver uma maior campanha de esclarecimento sobre a saúde dos rins e as doenças renais. Nesta breve entrevista, a especialista fala sobre a escassez de dados estatísticos, a importância do diagnóstico precoce, do tratamento conservador e também dos aprendizados deixados aos nefrologistas nestes dois anos de Pandemia. Confira a seguir:

1. A pandemia do COVID-19 teve um grande impacto na disfunção renal dos pacientes. Qual é o balanço dos aprendizados nos serviços de saúde nesses dois últimos anos?

Dra. Lygia Vieira: O envolvimento renal nestes pacientes é comum podendo variar desde a presença de proteinúria, o que pode caracterizar um tipo de doença renal, Glomerulonefrite, até a Lesão Renal Aguda que pode levar à necessidade de terapia renal substitutiva. A COVID-19, quando associada a Lesão Renal Aguda, tem alta mortalidade chegando a percentuais de mais de 70%. Portanto, neste período, o número de pacientes graves no respirador e em diálise foi muito elevado. Durante a pandemia chegamos a ter, no pico, cerca de 85% dos nossos procedimentos em pacientes com COVID-19. Ao longo do tempo, aprendemos a conduzir melhor principalmente no manejo clínico, antes de iniciar a diálise, e a indicá-la de maneira mais precisa. Além disto, enfrentamos vários desafios como um número enorme de leitos sendo abertos; a adaptação de espaços para os nossos equipamentos; escassez de recursos humanos e de materiais e equipamentos limitados pela alta demanda. Outro ponto desafiador foi realizar treinamentos na equipe de técnicos e manter a estabilidade emocional da equipe, tudo isto ocorrendo contra o tempo.

2. Qual o papel do nefrologista no suporte ao paciente crítico em unidades intensivas?

Dra. Lygia Vieira: O papel do nefrologista na abordagem ao paciente crítico é de fundamental importância. Quando os pacientes tem o diagnóstico de Lesão Renal Aguda com suas complicações clássicas, estamos vendo somente a ponta de um iceberg. Existe um número considerável de situações em que a doença renal poderia ser evitável e um número significativo que seria previsível principalmente em pacientes com algumas doenças prévias como Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus. Por isto é importante a possibilidade da avaliação precoce do nefrologista nos pacientes graves com o objetivo de prevenir ou evitar o agravamento da doença renal. O olhar e a avaliação do nefrologista, no dia a dia, junto com o intensivista pode evitar, por exemplo, um atraso no reconhecimento da Lesão Renal Aguda após a admissão hospitalar. Além disto, a possibilidade da melhor hora para indicar o início do procedimento dialítico sem esperar uma maior gravidade.

3. Atualmente, no Brasil, mais de 140 mil pessoas fazem diálise. Quais os principais desafios no país em relação à doença renal crônica?

Dra. Lygia Vieira: Existe uma dificuldade muito grande em coletar os dados epidemiológicos, ou seja, a informação tem uma fragilidade. A Sociedade Brasileira de Nefrologia vem compilando os dados e publicando através do Censo Brasileiro de Diálise. Entretanto, no último censo de 2020, somente 235 serviços de diálise, num total de 834, responderam. Temos a maior concentração na região sudeste: 48%, seguidas das regiões sul e nordeste, ambas com 19%, e na sequência, o centro-oeste e norte com 9% e 5%, respectivamente. Quando abordamos o paciente renal crônico em tratamento conservador, isto é, antes da diálise, este número é ainda mais incerto, pois são indivíduos que não têm acesso fácil ao sistema de saúde. Muitos destes pacientes já chegam numa fase irreversível da falência renal, quando nem chegam à unidade hospitalar a depender da região do país onde ele viva. Embora tenha uma DIRETRIZ CLÍNICA PARA O CUIDADO AO PACIENTE COM DOENÇA RENAL CRÔNICA – DRC NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – publicada pelo Ministério da Saúde, em 2014, para acompanhamento da doença renal, nem todos tem acesso. Falta campanha de esclarecimentos efetiva por isto mesmo a Sociedade Brasileira de Nefrologia e a Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT) vêm trabalhando incessantemente para dar visibilidade a especialidade e com isto chamar a atenção para a doença renal crônica e suas principais causas: a Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus. Todo indivíduo que sofrem destas doenças, obrigatoriamente, precisam fazer uma avaliação renal com uma simples dosagem da creatinina sérica e um sedimento urinário. Portanto, há necessidade do diagnóstico precoce, atendimento amplo com educação, equipe multidisciplinar, conscientização dos médicos de família, clínicos, cardiologista, endocrinologistas, urologistas e etc.

4. Quais os cuidados, como devo prevenir a doença renal e como fazer para estabiliza-la?

Dra. Lygia Vieira: Primeiro devemos identificar quais indivíduos apresentam fatores de riscos para desenvolver a doença renal. Aqueles que tem familiares com doença renal, os hipertensos, os diabéticos, os idosos, àqueles que tiveram lesão renal aguda e precisaram de diálise têm grande potencial para desenvolver lesão renal e devem ser investigados com triagem de exames de urina e dosagem de creatinina no sangue. Outros fatores também podem comprometer os rins como a obesidade, uso indiscriminado de anti-inflamatórios não hormonais, por exemplo. Dados do relatório VIGITEL Brasil 2020, inquérito telefônico para ≥ de 18 anos realizado nas capitais dos 26 estados e DF mostram o panorama e a importância da prevenção das principais causas. Alguns resultados deste inquérito evidenciaram excesso de peso em 57,5%, obesidade chegou em algumas capitais a 24,9%, Hipertensão arterial chegando a 30,1%, Diabetes Mellitus a 11,2%. A prática de atividade física regular somente alcançou 46,6%. Foi também relatado um baixo consumo de frutas e hortaliças, entre 21,4% e 48,6%. Portanto, para prevenir e diminuir a possibilidade da ocorrência desta doença recomendamos:

  • Reeducação alimentar: evitar a ingestão exagerada de excesso de sal, carne vermelha e gorduras;
  • Controle de peso corporal: prática de exercícios físicos regulares;
  • Evitar o fumo e o abuso de bebida alcoólica;
  • Controle da pressão arterial para os hipertensos;
  • Controle do colesterol;
  • Controle da glicose para os diabéticos;
  • Evitar o uso de anti-inflamatórios não hormonais;
  • Ter cuidado com quadros de desidratação;
  • Realizar, uma vez por ano, exames laboratoriais para avaliar a saúde dos rins: dosagem de creatinina no sangue e análise de urina;
  • Consultar regularmente seu clínico;
  • Não fazer uso de medicamentos sem prescrição médica.

Em relação ao tratamento para estabilizar ou diminuir a progressão da doença renal crônica, partimos do princípio de que já há um diagnóstico firmado e então nesta situação o paciente tem que já estar sendo acompanhado por um Nefrologista, porque é este profissional que deve conduzir e orientar estes casos apoiado pela equipe multidisciplinar.